quarta-feira, outubro 13, 2010

Farol Amarelo!

     Tenho por hábito utilizar frases de escritores que admiro em minha agenda, diário ou mesmo naquele espaço pessoal do MSN que a gente compartilha com nossos amigos. Muitos destes trechos e frases são retirados de obras famosas e, por esse motivo, são em geral muito conhecidos. Embora sejam muitas vezes banais, outras vezes estas frases acabam se tornando inspiradoras e sendo vistas como uma espécie de epifania, como se fossem um atalho para nossas questões mais profundas. No meu caso, essas frases representam uma forma de me sensibilizar para o cotidiano. É como um suspiro profundo no fim do dia, que me traz a consciência de que eu estive respirando o tempo todo, e que o dia acabou, mas eu não. E que preciso me manter alerta. É uma luz amarela indicando atenção! Não são simples frases de efeito.
      Nunca me interessei por biografias. Porque é como entrar em contato com uma fantasia alheia. Prefiro as minhas próprias impressões e fantasias.
      Acontece que hoje às 6h30 da manhã, enquanto tentava me recuperar de uma cólica que me tirou da cama às 4h10, terminei a leitura de "Clarice,", biografia de Clarice Lispector escrita por Benjamn Moser. E dizer algo sobre essa minha experiência é aceitar e acolher esse fôlego de vida que o farol amarelo me oferece mais uma vez.
     Ter conhecimento da infância de Clarice, das pessoas que a cercaram, do início de sua carreira como escritora, dos trechos de suas cartas enviadas a sua irmã e aos amigos mais chegados, nos tempos em que viveu fora do Brasil, é muito especial. Sobretudo as cartas e escritos que tratam do processo de composição de suas obras, de sua relação com os personagens e seus destinos.
     Acabei de rever uma entrevista sua feita em 1977, meses antes de sua morte, pela TV Cultura, disponível no Youtube.
     Em minha vida sempre me senti provocada por uma imensa sede. Sede de palavra. Sede de histórias. Muitos olhos que tenho encontrado em meu caminho, tão marcantes quanto os de Clarice,  têm me despertado essa sede. Observo todos os tipos de pessoas e imagino quantas histórias essas pessoas não têm podido escrever, quantas histórias anônimas poderiam surgir. Buscando essa mesma epifania, esse sentimento de alerta, senti hoje o quanto ainda tenho que me desarmar humildemente para ouvir as histórias que essas pessoas têm para contar e contar também ainda mais humildemente as minhas.
     Entre tantas possíveis, uma das citações mais belas de Clarice é um trecho de uma carta que ela escreve a sua irmã mais velha: "Ouça: respeite a você mais do que aos outros, respeite suas exigências, respeite mesmo o que é ruim em você - respeite sobretudo o que você acha que é ruim em você - pelo amor de Deus, não queira fazer de você uma pessoa perfeita - não copie uma pessoa ideal, copie você mesma - esse é o único meio de viver" (p.260). No início do livro "Uma aprendizagem ou O Livro dos Prazeres", ela diz: "A mais premente necessidade de um ser humano é tornar-se um ser humano". Pois é... Estamos tentando...


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