segunda-feira, março 30, 2009

"Home officers": trabalhando em casa!

Esta manhã li uma reportagem, de uma revista sobre saúde, cujo título era "Trabalhar em casa traz qualidade de vida ou traz estresse?". Claro que me interessei muito pela matéria porque, como sabem, trabalho em casa. Achei interessante o fato de haver um nome que "defina" esse tipo de trabalhador: "home officer". É de se esperar que "home officers" se refira, de um modo geral, aos profissionais que prestam assistência e consultoria a empresas integrados em redes on line e profissionais autônomos. Parece que a grande inovação desse método de trabalho é justamente a possibilidade de aumentar a "produtividade" do empregado, já que sugere uma melhor qualidade de vida (pois evita transtornos estressantes como o trânsito de ida e volta ao trabalho além do estresse do próprio dia-a-dia na empresa), e economiza na concessão e manutenção dos equipamentos de serviço da empresa (já que este profissional irá agora utilizar seus próprios equipamentos - computadores, tefefones, etc. - e terá, portanto, que se virar quando estes próprios equipamentos falharem).


Não satisfeita com a matéria da revista, fui procurar mais informações na net a respeito desses caras e encontrei muitos discursos animados de quem trabalha desse modo e, em vez de incitar à preguiça, consegue investir em "produtividade", acelerando seu tempo conforme o desejo. Acontece que boa parte desses "home officers", na fissura de controlar o próprio ritmo, podem se tornar workaholics, trabalhadores compulsivos. A essa altura pode parecer que estou viajando... E estou. É certo que eu não trabalho para nenhuma empresa, mas pertenço ao grupo daqueles que estão se aventurando nos percalços da vida acadêmica e, como tal, precisam dispor do tempo a seu favor. Desconsiderando então os problemas do mercado empresarial, mas considerando que nossa área também tem padecido com as demandas por "produtividade" intelectual - e nada poderia ser mais cruel para as ciências humanas -, algumas informações são muito importantes para quem trabalha em casa, principalmente em relação a dois probleminhas básicos que todo mundo que escreve uma dissertação ou tese tem que enfrentar: como lidar com o tempo? e como lidar com a ansiedade que o tempo gera?


Posso dizer que tirei boas dicas de tudo o que li e quero compartilhá-las, vamos lá. O processo é mais ou menos o seguinte, quem quer (ou precisa) trabalhar em casa deve ter em conta que a casa tem um ritmo próprio (das pessoas que circulam nela antes de você chegar com seu trabalho) e é preciso ser muito organizado para colocar limites entre sua vida profissional e sua vida pessoal. Ou seja, você está em casa, mas todos precisam entender que você está no trabalho e, portanto, é como se você não estivesse. Isso mesmo. Dizem os home officers, "não caia na síndome do 'Jaques': 'já que está em casa...'. Cuidado!


Cair nas garras da indisciplina e da preguiça, ou seja, não trabalhar da forma devida, acarretam fatalmente em ansiedade e desânimo, com tudo o que esses dois sintominhas trazem de ruim: muito sono, falta de sono, dores de cabeça, dores musculares, gastrite, ganho não desejado de massa adiposa, irritação (principalmente pelo ganho indesejado de massa adiposa), sentimento de incompetência, complexo de culpa, sem falar na auto-estima que vai a zero... Não esquecendo também da solidão que enfrentamos nos duros dias de trabalho intenso, que são necessários mas não precisam durar demais. As pessoas se acostumam com nossa ausência e, podemos não admitir mas isso dói. E parece que tem coisas na vida que quanto menos a gente faz menos quer fazer, mas sucumbir na inatividade é dramático demais também né... Mas a idéia aqui é ilustrar os dramas que corremos o risco de viver sempre que pisamos na bola e não damos o devido valor ao nosso tempo. Acho que quem trabalha dessa forma deve ter sentido alguns desses sintomas, até porque, no prazo final de entrega dos tranbalhos eles são praticamente inevitáveis. Mas não precisam ocupar todos os anos de mestrado e doutorado.


Devemos sentir muitas emoções nesta vida, o maior número possível delas, para o nosso próprio bem, mas tudo no seu devido lugar! Trabalhar é muito bom e necessário. E encontrar algo de que gostamos realmente e podermos escolher com o que queremos trabalhar é quase um sonho. Mas não podemos nos esquecer de que precisamos nos alimentar de outras formas também. Conviver com pessoas, encontrar os amigos, participar do dia-a-dia da família, ir ao cinema, namorar, andar pelas ruas, sentir o tempo, pisar na grama, saborear um sorvete tranquilamente sentado na calçada, caminhar, nadar, dançar sozinho no quarto, quem sabe, pescar... Também estamos aqui pra isso. Sem mais.
Muitos beijos a todos!!!

sexta-feira, março 13, 2009

Partilhando Experiências: por que não há os "outros"...


Vou expor aqui uma característica do trabalho que desenvolvo na Academia. Sou mestranda em Antropologia Social e a linha de pesquisa em que estou vinculada é a Antropologia da Religião. E o assunto que quero tratar hoje é justamente o meu método de pesquisa: o trabalho etnográfico. Podemos considerar que a parte mais trabalhosa e fundamental de um trabalho de antropologia (independente da linha de pesquisa) é a parte etnográfica que consiste em compreender o modo como as pessoas constróem sentidos para o mundo em que vivem a partir das experiências sociais que partilham conforme sua condição. Eu, como antropóloga, preciso então mergulhar na vida das pessoas, não como um entrevistador comum, não como um jornalista, não como um curioso, muito menos como um detetive. Meu mergulho precisa ser atento e ao mesmo tempo delicado porque cada detalhe pode significar muito. Por isso as entrevistas não são mais importantes do que aquilo que não é dito nelas, por isso a convivência é essencial. Acontece que essa convivência, que não tem prazo limite (exceto o imposto pelo pesquisador e seus sujeitos de pesquisa), acaba cobrando algo do pesquisador. Pode parecer que as pessoas se incomodem bastante com pesquisadores. Talvez sim, talvez com alguns. Mas creio que a grande maioria das pessoas acabe se agradando com a possibilidade de verem retradas em algum lugar suas idéias, suas experiências. E é preciso ter muita responsabilidade e respeito. É preciso reconhecer que a Teoria não pode ser usada para dizer o que gostaríamos de dizer sobre os "outros". A Teoria funciona como ferramenta para alcançarmos as pessoas e suas idéias e construirmos idéias sobre como esses processos se dão e não para explicarmos como o mundo funciona. Isso porque a questão não está nos "outros". Buscar os "outros" é sempre uma forma de chegarmos a nós mesmos. É por isso que cada conversa, cada experiência dentro de um grupo estudado envolve uma partilha de significados. Longe de ficar tentando adivinhar se o que as pessoas estão dizendo corresponde a uma "verdade absoluta", é preciso ter a consciência de que tudo o que dizem tem relação com a forma como se entendem ou gostariam de se entender neste mundo. E aí está nosso ponto de encontro. O que faço eu senão buscar também os meus sentidos... Estou escrevendo hoje apenas para agradecer aos meus "sujeitos" de pesquisa. Muito obrigada por partilharem um pouco de vocês comigo. Certamente um pouco de mim também está com vocês, pois no esforço em me debruçar sobre o que desconheço é que aprendo o quanto me ensinaram a conhecer mais de mim mesma. Escrevendo as histórias de "outras" pessoas engrosso também as páginas de minha própria história.

quinta-feira, dezembro 25, 2008

Não à Dualidade, Sim à Diversidade



Há uns 4 meses eu entrei numa livraria desejando que algum livro me encontrasse e apareceu em minhas mãos o livro "O Homem Duplicado" de José Saramago. Pela sinopse, tratava de um apático professor de história que reconhecia em um filme um ator com a aparência idêntica à sua. Não alguém semelhante, mas um duplicado. Percorrendo as angústias de um homem comum, a narrativa propunha um olhar crítico em relação ao individualismo ocidental e à crise de identidade provocada pela busca incessante da perfeição física. Fiquei completamente seduzida, parecia um livro e tanto... Como eu já havia lido "Ensaio sobre a Cegueira" e havia gostado muito, decidi explorar mais uma obra do autor. Levei o livro para casa. Tentei começar a leitura na primeira noite mas não estava muito empolgada, deixei o livro de lado por semanas. Passei uns 2 meses lendo uma página por dia antes de dormir. Colocava o pijama, sentava na cama, ajustava o despertador, lia uma página, fechava o livro e adormecia. Pela manhã, colocava o livro na estante e só voltava a pegá-lo à noite, 5 minutos antes de dormir. Havia uma única explicação para tal atitude, achei o livro chato. A trama não me causava curiosidade porque parecia que tudo acontecia muito lentamente, e eu não conseguia avançar. Bem, de fato tratava-se de um homem comum, um sobrevivente da pós-modernidade, que parecia bastante entediado com sua vida, sua história, seu trabalho, sua namorada, seus caminhos. E o tédio desse homem era retratado com tal substância que me entediava também. Às voltas com o tormento que lhe causava saber que havia outro de si mesmo, Tertuliano Máximo Afonso (nosso professor de história) chega a se encontrar cara a cara, pêlo a pêlo com o seu duplicado. No entanto, temendo que a curiosidade do outro fosse maior que a sua, Tertuliano decide se afastar e continuar sua vida. Mas a situação só muda porque seu duplo a reverte quando começa a enveredar pela vida do professor da forma mais obstinada e cruel. E a trama ganha o fôlego de um filme de terror. Claro que não tenho a intenção de contar o fim do livro, mas foram nas 100 últimas páginas que eu perdi o sono e não descansei enquanto não terminei a leitura. E posso dizer que fiquei assustada, aliviada e maravilhada. Assustada porque o livro mostra uma das faces do terror que pode ser a condição humana. Aliviada porque o livro valeu à pena. E maravilhada porque passei as últimas 5 horas, após ler o final, tentando ajustar o que Saramago gostaria de nos dizer ao que eu poderia compreender. O que mais me fascina na literatura é justamente isso, a possibilidade de discorrer por vidas possíveis, e seus dramas, e retornar à minha sempre modificada. O que eu finalmente gostaria dizer hoje, além de que vale muito à pena se aventurar nesta ficção, é que a idéia da dualidade ainda é nossa grande perversora, porque nos faz crer oscilarmos entre o “ser” e o “não ser”, provocando uma grande sensação de incompletude, como se o que nos negasse também não pertencesse a nós mesmos. De fato Saramago é brilhante em expor uma das maiores angústias humanas, o medo de que nossa vida seja menos importante do que a do outro, medo que pode nos aprisionar numa relação de busca da felicidade e tédio por não compreender o que encontrou. Talvez seja isso que faça com que tenhamos uma curiosidade perversa diante da vida alheia. E o tédio consigo e a curiosidade com o outro é o que faz com que Tertuliano se perca de si mesmo irremediavelmente. Mas, ao mesmo tempo, é só quando ele se perde de si que ele encontra forças para lutar pelo direito de existir em sua própria condição e não na de outros. E talvez nossa maior redenção ainda seja conseguirmos ser reconhecidos por aqueles que nos amam, mesmo que estejamos escondidos de nós mesmos...





domingo, novembro 23, 2008

Prefácio


Sorte
- Maria Bethânia -

Se aquela estrela
Velar por nós
Será que escuta
minha voz?
E me ajuda
atravessar
a noite escura
que vai passar...

Pode estar escrito
em algum lugar
Ou a gente escreve
ao caminhar

Onde estiver
olhe para o céu
Essa estrela vai guiar
onde você for
Seja o que for
tiver que ser
Olhe para o céu
para agradecer

Pode estar escrito
em algum lugar
Ou a gente escreve
ao caminhar

Pode estar escrito
em algum lugar
Ou a gente escreve
ao caminhar


Ao fim do filme "O signo da cidade" (Brasil - 2008) a suave voz de Maria Bethânia interpreta esta música chamada "Sorte", trazendo a mim uma sensação de profunda melancolia e desejo de eternidade. Isso porque me conduz a um período de minha vida em que eu, tal qual a letra, buscava nas estrelas o sentido da vida. Ao contrário da personagem do filme, eu não procurava respostas em mapas astrais, era na própria existência das estrelas que eu buscava o motivo do existir de todos nós. Eu contemplava o universo, pleno de luz e escuridão, onde o tempo deixa de existir para permitir o mistério, mistério que generosamente nos deixa viver em uma galáxia bem pequenina, em algum lugar quase imperceptível. Retomar esse sentimento é então continuar a refletir sobre o que pode ser considerada a maior incerteza humana. Religiosos, estudiosos, todos estão à procura da eternidade. Talvez a vastidão do universo tenha colocado no homem esse desejo, talvez o mistério. O fato é que ele existe. E cada um de nós necessita preencher esse vazio, o vazio da incerteza. Alguns de nós aprenderão com a religião que a vida continua após a morte, aqui mesmo na Terra, no Paraíso, no Céu, ou mesmo em outra forma de vida. Outros de nós aprenderão que não há nada além desse mundo e que só temos uma oportunidade de viver, de ter consciência, e que após a morte deixaremos de existir. O que eu não sei é se alguém passa pelo mundo sem pensar nisso e sem precisar acreditar em alguma coisa. Seja como for, a humanidade pode ter passado por incríveis transformações ao longo dos séculos, mas sempre vai precisar destes oráculos, às vezes de veneno, para se amparar, para conseguir sobreviver. Dizem que a quantidade de átomos que deu origem ao universo é constante, ou seja, é a mesma até hoje. Isso significa que pra onde quer que formos nós, faremos parte de alguma coisa, e que assim sendo, nunca seremos apagados do universo. Por isso eu acho que o medo da morte é mais um medo de perder a consciência da vida, mas ao mesmo tempo não sei se temos consciência alguma dessa energia tão poderosa que nos deixa existir. Daí a melancolia e o desejo de eternidade, entre a sensação triste da solidão diante desta imensidão e o júbilo de fazer parte de tudo o que existiu, existe e existirá. Estamos fadados à eternidade, ao eterno caminho de sair dela e a ela retornar...

Por isso início esse blog, para que ele seja um espaço onde eu possa jogar as inquietações, expectativas, estranhamentos e encantamentos desse meu caminhar!